Algumas tecnologias estão transformando
profundamente a vida em sociedade. A Inteligência Artificial (IA), por
exemplo, está por trás de diversos projetos envolvendo carros
autonavegáveis, comandos efetuados por voz, reconhecimentos faciais e
filtros de conteúdo em redes sociais. No campo dos sistemas aéreos não
tripulados (Unmanned Aerial Systems – UAS), vislumbram-se
múltiplas aplicações comerciais, como meios de entregas e até de
transporte público, na forma de taxi aéreos.
Não por acaso, estima-se que a indústria de drones
comerciais nos Estados Unidos tenha saltado de US$40 milhões, em 2012,
para aproximadamente US$1 bilhão, em 2017 – e, em 2026, esse mesmo
segmento pode representar um impacto na faixa de US$31-46 bilhões no
Produto Interno Bruto (PIB) norte-americano. Paralelamente, a área de
cibersegurança permeia vários outros campos, na medida em que
equipamentos e “sistemas de sistemas” cada vez mais complexos também se
tornaram presa fácil para ataques cibernéticos. Em 2023, o mercado de
cibersegurança pode alcançar um montante de US$248 bilhões.
Evidentemente essas transformações
afetam diretamente as mais modernas Forças Armadas. Na Estratégia
Nacional de Defesa dos Estados Unidos de 2018, por exemplo, ressalta-se a
importância dos desdobramentos das novas tecnologias comerciais para a
sociedade e para o fenômeno da guerra, especialmente tendo em vista a
perspectiva de que muitos desenvolvimentos tecnológicos virão dos
setores comerciais de ponta. Já a China tem investido em IA, por
exemplo, como parte de um conjunto mais amplo de esforços para o
desenvolvimento de uma série de veículos autônomos (aéreos, terrestres e
navais), bem como de jogos de guerra e simuladores. Entre os planos de
Beijing para alcançar o objetivo de ser o líder mundial em IA está a
construção de um polo de pesquisa, com o custo estimado em US$2,12
bilhões, abarcando até 400 empresas e parcerias com universidades.
Outros países também estão enveredando
esforços nesses novos campos com enfoque em segurança e defesa
nacionais. Os planos da Índia incluem o estabelecimento de uma Agência
de Defesa Cibernética com mais de 1000 integrantes distribuídos em
diferentes posições no Exército, na Marinha e na Força Aérea. A Rússia
tem explorado o uso de IA em, por exemplo, mísseis de cruzeiro, drones
armados, guerra eletrônica e inteligência de imagens. Apenas na área de
IA, estima-se que Moscou tem investido anualmente cerca de US$ 12,5
milhões. Já a Alemanha almeja criar sua própria versão da
norte-americana Defense Advanced Research Projects Agency (DARPA).
O impacto dessa realidade para as mais
modernas Forças Armadas é evidente, pois afeta diversos elementos de
doutrina, organizacionais, de adestramento, de material, de educação, de
pessoal e de infraestrutura. Diante das perspectivas de proliferação de
mísseis hipersônicos, robôs armados, lasers, canhões
eletromagnéticos e dos avanços da computação quântica, vários países têm
buscado se adaptar constantemente a essas inovações, priorizando
recursos em equipamentos e otimizando estruturas de pessoal e custeio.
No Reino Unido, por exemplo, um dos
poucos membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) que
conseguem cumprir as metas de alocação de 2% do Produto Interno Bruto
(PIB) em defesa e 20% desse montante em Equipamentos, observa-se uma
série de dificuldades políticas na definição de prioridades e do tamanho
do efetivo de suas Forças Armadas. Ademais, tanto nas reformas dos
aparatos de defesa iniciadas pela Rússia, em 2008, e pela China, em
2015, por exemplo, houve profundas mudanças organizacionais com foco
conjunto e redução de efetivos, além de estabelecimento de planos de
equipamentos de médio e longo prazo.
Seguir essa vasta onda de transformações
é um enorme desafio para qualquer país. No Brasil, o processo de
atualização, para 2020, dos documentos Política Nacional de Defesa
(PND), Estratégia Nacional de Defesa (END) e Livro Branco de Defesa
Nacional (LBDN) apresenta-se como uma valiosa oportunidade para
enfrentar tais questões, sobretudo quando considerados os históricos
tanto do orçamento de defesa brasileiro quanto dos investimentos
nacionais em Ciência e Tecnologia. Nesse sentido, o que está claro é que
o acelerado avanço tecnológico vai continuar – independentemente de o
Brasil conseguir ou não acompanhá-lo.