O tema nos insere no campo das relações
internacionais, muito bem caracterizadas por Montesquieu em O Espírito
das Leis (1784) “O direito das gentes baseia-se naturalmente neste
princípio: as várias nações devem fazer-se mutuamente o maior bem
possível em tempo de paz e o menor mal possível em tempo de guerra, sem
prejudicarem seus genuínos interesses”.
Por sermos militares, talvez apreciemos
tanto essa afirmação porque ela percorre um espectro de conceitos
filosóficos envolvendo ética e pragmatismo muito caros para nós. Na
primeira parte, o iluminista parece ser absolutamente ético – e até
utópico – na citação do maior bem e do menor mal a se fazerem na paz e
na guerra, mas, simultaneamente, os relativiza, dimensionando-os com o
possível. Em seguida, continua a satisfazer nossa vocação de
profissionais, condicionando tudo, pragmaticamente, aos genuínos
interesses da nação, que estão na gênese da profissão militar. A nossa
tão significativa Canção do Exército retrata essa complementaridade
ético-pragmática com o maravilhoso estribilho “A paz queremos com
fervor; a guerra só nos causa dor. Porém, se a Pátria amada for um dia
ultrajada, lutaremos sem temor! ”
Nacionalismo – o orgulho de pertencer à
Nação brasileira – é outro campo para o qual o tema deste artigo nos
remete. Certa feita, após palestra para empresários estrangeiros
curiosos acerca do Plano Básico de Ciência e Tecnologia do Exército, um
deles perguntou se os militares brasileiros eram muito nacionalistas,
como se tratasse de um óbice para seus investimentos no Brasil em
material de defesa, dado que exigíamos transferência de tecnologia para
os projetos em comum, desde a fase de desenvolvimento. A resposta não
poderia ser outra: “Sim. E se não fôssemos, estaríamos errados. Porque
os genuínos interesses nacionais são da essência da nossa profissão.
Creio que assim seja em todos os países ” .
No Brasil, o duplo processo contínuo de
formação da nacionalidade e do Estado passou a ser perceptível a partir
do Sec. XVII, na luta contra os holandeses – quando pela primeira vez se
formaliza o conceito de Pátria –, que também marca a real origem do
Exército Brasileiro. O processo perpassou a Colônia, o Reino Unido, o
Império e se estende continuamente pela República, sempre reforçando
nossa maneira nacionalista de interpretar a soberania nacional.
Desencadeado pelas delegações tácitas do povo ao Estado nascente, o
processo nasceu com a chancela da soberania popular – uma fonte em
relação à qual os militares são muito sensíveis. Logo, no cadinho de
caldeamento da cultura militar, se fundem, desde sempre, soberania
popular, nacionalidade, Estado, soberania nacional e Forças Armadas.
Assim fizemos a têmpera do espírito
nacionalista, do patriotismo – o senso de corresponsabilidade pelo
destino do País – e do zelo pela soberania. Esses fatores explicam a
razão de os componentes da Força Expedicionária Brasileira terem levado
no peito a gana de justiçar além-mar à afronta nazista no Atlântico Sul;
o nosso apego à defesa da Pátria; e o porquê de atribuirmos alta
relevância ao serviço na faixa de fronteira. E de sempre sermos a
primeira voz do Estado a apontar riscos mal calculados em algumas
decisões ou omissões governamentais sobre, por exemplo: 1) terras
indígenas e de proteção ambiental sobrejacentes a províncias minerais
nobres e/ou a cavaleiro da fronteira; 2) extensão total de terras
indígenas acima dos 10% do território nacional; 3) elevado número de
ONGs estrangeiras na Amazônia; 4) aquisição de amplas glebas na faixa de
fronteira por nacionais de potências estrangeiras; 5) desnacionalização
de empresas de valor estratégico; (6) vistas grossas à expropriação de
nossas refinarias na Bolívia; e (7) descaso com o poder dissuasor
brasileiro.
Essa nossa atitude decorre da
complementaridade ético-pragmática da profissão militar e faz parte da
perseverança, desde Guararapes, em não admitirmos qualquer tentativa de
divisão do povo brasileiro, nem o finca-pé de pontas de lança militares
estrangeiras e de ideologias internacionalistas, prepostas do menor mal
possível com prejuízo de nossos genuínos interesses.