Por: Major de Infantaria Vanderson Mota de Almeida_ Exército Brasileiro
Há 71
anos, em 10 de dezembro de 1948, a Organização das Nações Unidas (ONU) celebrou
a Declaração Universal dos Direitos Humanos em resposta às barbáries cometidas
por Adolf Hitler nos campos de concentração nazista, durante a Segunda Guerra
Mundial (1939-1945). Desde então, o tema ganhou relevância no cenário
internacional em apoio aos inúmeros grupos minoritários, principalmente quanto
aos refugiados.
Em
1951, durante a Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, o termo
refugiado foi cunhado para todo indivíduo que, temendo perseguição por raça,
religião, nacionalidade, grupo social ou associação política, se desloca para
fora de seu país de origem, não podendo ou não regressando ao mesmo em razão
dos temores citados.
Atualmente,
de acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados
(ACNUR), mais de 70,8 milhões de pessoas encontram-se deslocadas à força pelo
mundo, sendo que cerca de 25,9 milhões são refugiados e 3,5 milhões são
solicitantes de reconhecimento da condição de refugiado. Na atual década, o
Brasil concedeu refúgio em seu território a migrantes de diferentes origens,
principalmente da América Latina, África e Oriente Médio, os quais
deslocaram-se por motivos de conflitos étnicos-religiosos, guerras civis
locais, existência de regimes políticos ditatoriais e instabilidades política e
econômica, buscando proteção e melhor qualidade de vida.
Recentemente,
o fluxo migratório de venezuelanos para o Brasil cresceu consideravelmente
devido à crise humanitária existente na Venezuela. Conforme dados da Polícia
Federal, em 2017, 17.943 venezuelanos solicitaram refúgio no Brasil. Já em
2018, esse número aumentou para 62.295. Roraima é o estado da federação que
recebe o maior número de solicitações de refúgio de venezuelanos, sendo quase
81% do total.
Com
isso, o governo federal reconheceu, por meio da Medida Provisória n° 820, de 15
de fevereiro de 2018 e dos Decretos n° 9.825 e 9.826, de 15 de fevereiro de
2018, o aumento do fluxo populacional de venezuelanos em situação de
vulnerabilidade, no estado de Roraima, assim como a dificuldade desse estado em
garantir aos migrantes os mesmos direitos que proporcionava aos brasileiros em
face do aumento da demanda pelos serviços públicos essenciais. Desta forma, as
Forças Armadas constituíram a Força Tarefa Logística Humanitária (FT Log Hum),
com o apoio de órgãos federais; organizações internacionais e não
governamentais, para proceder a ações de ajuda humanitária a partir da execução
da Operação Acolhida.
A
Operação Acolhida tem como missão realizar medidas emergenciais para evitar uma
crise humanitária em território nacional, baseadas no ordenamento da fronteira,
no abrigamento e na interiorização dos migrantes venezuelanos. Para isso, a
operação foi estruturada em duas Áreas de Acolhimento e Apoio: uma no município
de Pacaraima e outra no município de Boa Vista. Nessas áreas, foram montadas
estruturas como Postos de Recepção, Postos de Identificação, Postos de Triagem
e Abrigos, além de um Posto de Atendimento Avançado (PAA), em Pacaraima.
Nesses
postos e abrigos, os venezuelanos recebem atendimentos para solicitação de
refúgio, de residência temporária e de documentos; atendimento médico e odontológico;
vacinação; abrigamento; alimentação e inspeções de saúde para interiorização.
Em julho de 2019, a capacidade máxima dos abrigos para atender os venezuelanos
era de, aproximadamente, 7.300 vagas. Diariamente, 18.000 etapas de alimentação
eram distribuídas, em média. Cabe destacar que os abrigos foram
organizados para recepcionar os refugiados sem distinção de raça, gênero e
estado civil, como o Abrigo Janokoida, que acolhe índios venezuelanos da etnia
Warao, e o Alojamento BV-8, que possui abrigamento em separado para atender
tanto a famílias constituídas quanto a mulheres e homens solteiros, tudo com a
finalidade de proporcionar aos migrantes o mais amplo exercício dos direitos
humanos e liberdades individuais.
Com
relação à interiorização, do início da operação até julho de 2019, a FT Log Hum
e outras instituições civis interiorizaram cerca de 13.000 migrantes
venezuelanos para as demais regiões do País. Essa ação humanitária tem
propiciado aos refugiados oportunidades de emprego em outros estados, como no
Amazonas, em São Paulo e no Rio Grande do Sul, criando condições para a
inclusão socioeconômica dos imigrantes no território nacional.
Do
exposto, a Operação Acolhida demonstra a capacidade das Forças Armadas para
realizar ações de ajuda humanitária no acolhimento de migrantes vulneráveis no
território nacional, num momento em que o número de refugiados aumenta
pelo mundo. Muitos são rejeitados ou impedidos de entrarem pelas fronteiras de
inúmeros países, provocando polêmica no tocante aos direitos humanos.
Por
fim, o emprego das Forças Armadas para acolher os refugiados venezuelanos
ratifica o posicionamento do Brasil, diante da comunidade internacional, em
proteger o que prescreve a legislação do Direito Humanitário Internacional, bem
como reforça a prevalência dos direitos humanos como um dos princípios
constitucionais das relações internacionais do Estado brasileiro, conforme o
artigo 4º da Constituição da República Federativa do Brasil, de 1988.
O Major de Infantaria Vanderson Mota de Almeida é bacharel em Ciências Militares, pela Academia Militar das Agulhas Negras (2001), pós-graduado em Ciências Militares, pela Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (2010) e especializado em Bases geo-históricas para o Planejamento Estratégico, pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (2014). Foi instrutor do Curso de Infantaria, da Academia Militar das Agulhas Negras, no triênio 2014-2015-2016. Em 2004 e 2006, foi integrante do 1º e 5º Contingentes da Missão das Nações Unidas para Estabilização no Haiti (MINUSTAH). Possui os Cursos Básico Paraquedista e Mestre de Salto. A última função exercida foi a de Comandante dos Elementos Destacados, do 2º Batalhão de Fronteira, sediado em Cáceres/MT. Atualmente, é aluno da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, e mestrando do Instituto Meira Mattos/ECEME.