Coronel Swami de Holanda Fontes
Apesar de existir há longa data, a
comunicação estratégica ganhou, nos últimos tempos, uma nova
envergadura, fruto do ambiente informacional, das novas tecnologias, dos novos
meios de comunicação e do ambiente psicossocial do século 21.
Sem retroagir demais no tempo, realizando uma
abordagem da temática
de maneira superficial e não havendo a pretensão
de se aprofundar nas revoluções e na guerra
fria, entre outros acontecimentos, é possível, por exemplo,
fazer um paralelo com quatro momentos marcantes da história.
A Primeira Guerra Mundial ou a Guerra
das Trincheiras teve como característica o emprego de
operações defensivas, em que o combate
era realizado efetivamente corpo a corpo. Naquela época, os
meios de comunicação ainda eram incipientes, quando comparados com os
existentes na atualidade. Logo após o conflito, imaginando ter usado uma
estratégia exitosa, a França construiu a Linha Maginot, que era um conjunto de
fortificações visando à defesa contra a Alemanha e a
Itália.
Quebrando paradigmas, a Alemanha
iniciou a Segunda Guerra Mundial, conhecida como a Guerra de
Extermínio, com algo inesperado, com manobras ofensivas e com
a Blitzkrieg ou a guerra-relâmpago. Apesar do termo Blitzkrieg não
ser empregado pelas forças armadas nazistas, a palavra foi amplamente
usada como propaganda na imprensa. Naquele período, o
Ministério da Propaganda, de Joseph Goebbels, assumiu o controle das
instalações de radiodifusão dos países conquistados e difundiu suas mensagens
para ganhar a confiança dos cidadãos. A comunicação atingiu um novo patamar.
Anos depois, uma superpotência nuclear
enfrentou um oponente fraco que adotou uma estratégia antiga – a
Guerra da Resistência. Na Guerra do Vietnã, os Estados Unidos também perderam o
conflito em casa, quando a imprensa mostrou seus filhos retornando para casa
em sacos pretos. Sem o controle dos meios de comunicação, o governo perdeu a
opinião pública, acelerando sua derrota e consequente saída do
continente asiático. Nesse conflito, a comunicação contribuiu para o
seu desfecho.
No início da década de 90 do século
passado, a Guerra do Golfo, ou a Guerra Cirúrgica, caracterizou-se pelo
emprego de mísseis, bombas e foguetes que atingiam seus alvos com precisão, diminuindo
os danos colaterais. Nesse conflito, em uma coalizão liderada
pelos Estados Unidos contra o Iraque, a comunicação foi evidenciada ao
mostrar as linhas de frente ao vivo, com transmissão via satélite, 24 horas por
dia.
De uma forma resumida, o
que pôde ser visto foi o emprego de estratégias inesperadas e o
crescente peso da comunicação no desenrolar dos conflitos.
Mas, o que é estratégia?
Existem vários conceitos, mas de uma forma
sintética, pode-se dizer que é o emprego dos diversos meios para se atingir um
objetivo político imposto. Não se deve confundi-la com tática, que
envolve manobras ou ações menores. Mesmo que se acerte em várias ações táticas empregadas,
se a estratégia estiver equivocada, dificilmente o objetivo será
alcançado, ou seja, um problema estratégico não se cura com tática.
E o que é comunicação?
É uma ação em que seres
humanos e/ou animais partilham diferentes informações entre si. Ocorre
quando o receptor entende a ideia do que foi transmitido pelo autor da
mensagem. Quando os homens das cavernas deixavam seus desenhos nas paredes, e
outros viam as figuras e entendiam o que elas queriam dizer, é possível dizer
que, naquele momento, estava ocorrendo a comunicação.
Assim, o que seria a comunicação estratégica?
No meio civil, não há um
conceito unânime, mas, se somarmos as duas ideias aqui abordadas, podemos
dizer que é o emprego integrado dos diversos meios disponíveis para que a
comunicação ocorra com eficácia e com o alcance esperado.
Para o Exército Brasileiro, é a
comunicação alinhada, integrada e sincronizada com os Objetivos Estratégicos do
Exército, impondo a combinação das práticas tradicionais de Comunicação Social
(relações públicas, divulgação institucional e assessoria de imprensa) com as
relações institucionais e com o emprego das mídias digitais. Na atualidade,
parte dessas ações ocorrem no ciberespaço.
No entanto, há algumas considerações
que devem ser levadas em conta: a opinião pública, os meios de comunicação disponíveis
(tecnologias, mídias etc), os óbices a serem superados (acesso a
informação, desinformação etc), a liberdade de ação e o centro de
gravidade.
A opinião pública é fundamental para
que se tenha a liberdade de ação, constituindo o centro de
gravidade na dimensão informacional. A liberdade de ação se
refere às limitações decorrentes de diversas circunstâncias. Dessa
forma, em um mundo onde a ética, a verdade, a transparência e os
valores morais são postos à prova, a comunicação estratégica deve ser pautada
nos princípios da unidade de mensagem, legitimidade, imparcialidade,
impessoalidade, continuidade, confiabilidade, proatividade e verdade e ser empregada
com oportunidade, transparência e credibilidade. Além disso, deve-se levar
em conta a disponibilidade dos recursos financeiros, tecnológicos e humanos.
Qual seria o centro de gravidade em
uma comunicação estratégica?
Levando-se em consideração os
atores envolvidos, a liberdade de ação, a opinião pública e o objetivo
estratégico determinado pela política, é possível que sejam os meios de
comunicação, incluindo nesse pacote os jornais, os canais de televisão, as
rádios, as mídias sociais etc. Lembremos que o centro de gravidade é o
ente que se tivermos o seu controle, facilita a conquista do nosso
objetivo, desestruturando o poder do adversário.
Não é à toa que os líderes, normalmente, querem
controlar ou até dominar os meios de comunicação, sempre com o intuito de
manipular narrativas e, assim, conquistar a opinião pública. Em momentos
críticos, a censura atua exatamente nos meios de comunicação. Apesar da guerra
das narrativas, das fakenews, das deepfakes e de outras
ferramentas de desinformação não possuírem suas origens nos meios de
comunicação, já que os autores são normalmente desconhecidos, são nos meios de
comunicação que elas circulam.
Na atualidade, estamos vivenciando uma
revolução que já se encontra em progresso no campo virtual, isto
é, no mundo cibernético. Um simples toque no teclado do computador pode causar
mais danos do que o puxar de um gatilho. O ato de teclar pode provocar reflexos
imediatos no outro lado do planeta e causar danos inimagináveis. Assim como em
uma guerra tradicional ou convencional, a Guerra do Teclar envolve
estratégias: objetivo imposto, planejamento, caminho a seguir,
conhecimento e disposição dos meios, óbices a serem superados, centro de
gravidade a ser considerado, local da ação e nível de
liberdade que se tem para agir.
Afinal, a comunicação estratégica é uma
ciência ou uma arte?
É uma ciência porque envolve estudo,
pesquisa e método, e também uma arte porque necessita da
criatividade, do inusitado e da quebra de padrões. Basta lembrar que
a Blitzkrieg superou a linha Marginot, e que a
resistência venceu as armas nucleares. A reflexão que se deve fazer
agora é: “A Guerra do Teclar” já está em andamento, no entanto, o que vai
superá-la?
Sobre o autor
O Cel Fontes é Oficial de Artilharia oriundo da Academia Militar das
Agulhas Negras. Possui os seguintes estágios e cursos pelo Exército Brasileiro:
estágios de comunicação social, de Escalador Militar e de Operações
Psicológicas, capacitação em Planejamento Estratégico Organizacional, especialização
em Bases Geo-Históricas para Formulação Estratégica, mestrado em Operações
Militares e mestrado em Ciências Militares, cursos de Comando e Estado-Maior,
Básico Paraquedista e Básico de Inteligência Militar. Na Agência Brasileira de
Inteligência realizou o curso de Noções do Fenômeno Terrorismo e na Escola
Superior de Guerra, o Curso de Extensão de Doutrina de Operações Conjuntas. No
exterior, especializou-se em Inteligência Estratégica no Instituto de
Inteligência das Forças Armadas Argentinas; em Segurança Militar Nacional e
Comando na Universidade de Defesa Nacional da China; em Doutrinação Política em
Comunicação Social e em Operações em Comunicação Social, estes dois últimos
cursos realizados na escola da Organização do Tratado do Atlântico Norte
(OTAN), na Alemanha. Foi analista de inteligência do Ministério da Defesa e
analista de Contra-Inteligência no Centro de Inteligência do Exército. Comandou
os Grupos de Operações de Inteligência da 3ª Brigada de Infantaria Motorizada
em Cristalina/GO e da 16ª Brigada de Infantaria de Selva em Tefé/AM, o Núcleo
de Preparação de Oficiais da Reserva do 3º Grupo de Artilharia de Campanha -
Regimento Mallet, em Santa Maria/RS, o curso de Artilharia da Escola de
Aperfeiçoamento de Oficiais no Rio de Janeiro/RJ e o 7º Grupo de Artilharia de
Campanha - Regimento Olinda, em Olinda/PE. Atualmente é o chefe da Divisão de
Relações Públicas do Centro de Comunicação Social do Exército.