segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Política_ Movimentos sociais defendem cotas para negros, indígenas e transexuais na pós-graduação

Brasília/DF_  Participantes de uma videoconferência promovida pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados defenderam, nesta segunda-feira (27), a criação de cotas para acesso de pessoas negras, indígenas, oriundas de comunidade quilombola, com deficiência ou transexuais às vagas de pós-graduação nas universidades brasileiras.

O objetivo é que se formem comunidades científicas e corpos docentes que reflitam a realidade da população brasileira.

O assunto já está em análise na Câmara e constitui o teor do substitutivo apresentado pela deputada Natália Bonavides (PT-RN) ao Projeto de Lei 3402/20, da deputada Marília Arraes (PT-PE) e outros parlamentares.

Originalmente, a proposta torna obrigatória a reserva de vagas da pós-graduação para alunos vindos de escolas públicas. Natália Bonavides, no entanto, propõe a reserva de no mínimo 50% das vagas para concorrentes com deficiência, negros, oriundos de comunidades quilombolas e indígenas.

A relatora entendeu que aplicar simplesmente a Lei de Cotas, que já prevê a reserva de vagas nos cursos de graduação para alunos de escolas públicas, talvez não surtisse o efeito desejado na pós-graduação. Conforme explicou, com a lei de 2012, a maioria de estudantes da graduação passou a ser de pretos e pardos, mas a mudança não se refletiu na pós-graduação.

“O dado pode ser revertido com a política afirmativa na pós-graduação. É o que a gente acredita e o que a gente pretende. Hoje, com a falta de uma política nacional sobre o tema, cada universidade tem agido por si. Existem alguns programas de pós-graduação, mas não são políticas uniformes, estão longe de alcançar a maioria dos programas de pós-graduação”, disse Natália Bonavides.

Gustavo Sales/Câmara dos Deputados

Rita de Oliveira participa de audiência pública virtual
Rita de Oliveira quer garantir o ciclo completo da afirmação racial

Ciclo completo
Segundo a coordenadora do Grupo de Trabalho de Políticas Etnorraciais da Defensoria Pública da União (DPU), Rita de Oliveira, a reserva na pós-graduação visa a garantir o ciclo completo da afirmação racial nos ambientes acadêmicos.

“A mudança do corpo docente das universidades passa indubitavelmente pelo aumento da presença das pessoas negras, indígenas, com deficiência e trans com título de mestrado e doutorado. Mas é fato que, apesar das normas indutoras já existentes, os referidos grupos historicamente não têm tido acesso aos cargos de professorado”, criticou.

Na avaliação de Rita de Oliveira, o substitutivo acerta ao não replicar o modelo da lei da graduação, porque o atrelamento da cota racial às sociais pode tornar o programa hostil às pessoas negras ou com deficiência.

Também o professor da Universidade Federal do Paraná Paulo Vinicius Silva afirmou que a desigualdade racial se acumula ao longo do processo da educação e, na pós-graduação, há uma prevalência de pessoas brancas.

“Na academia, há a entrada para o mestrado e o doutorado com maior seletividade. A gente tinha entre 1% e 2% [de negros] nas carreiras e, na pós-graduação atuando como docente, era 0,5% de acordo com um levantamento feito em 2005 nas principais universidades de pesquisa brasileiras. Então, mais de 50% da população é negra e somente 0,5% como docente de pós-graduação. É uma segregação racial gigantesca que a gente não consegue combater”, lamentou.

As políticas afirmativas, segundo Paulo Vinicius Silva, devem ser pensadas no médio e no longo prazo e trazem consigo o combate às demais desigualdades sociais, incluídas as sofridas pelas mulheres ou pelas pessoas trans. “A gente só vai ter resultado em 10, 15, 20 anos, se a gente tiver políticas concretas e investimento.”

Falando em nome dos indígenas, o coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Alberto Terena, acrescentou que essa população precisa não só de acesso, mas de permanência dentro da academia.

Outros participantes
A audiência contou ainda com outros representantes dos movimentos negro, de pessoas com deficiência e de travestis e transexuais.

A deputada Marília Arraes, que conduziu parte da reunião, observou que o evento foi realizado em um “momento de retrocesso”. “Eu pensava que em 2021 a gente ia estar comemorando direitos conquistados, e não lutando para garantir direitos.”

A relatora Natália Bonavides ouviu a todos e anotou sugestões para seu relatório, que poderá ser reformulado. O texto foi apresentado no último dia 21 e ainda vai ser votado pela Comissão de Educação.

Fonte: Agência Câmara de Notícias

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