Por 1º Sgto Antonio Vagner Machado Pires
Atualmente, está consolidado o entendimento de que o emprego militar, em qualquer conflito, alcançará sucesso por meio de operações conjuntas (Op Cj) e interagências e, às vezes, de forças multinacionais. Mesmo em operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), a sinergia entre as forças singulares é fator decisivo para o êxito da missão. Desde a década de 90 do século passado, com a criação do Ministério da Defesa (MD), as Forças Armadas (FA) brasileiras vêm desenvolvendo a doutrina de emprego conjunto a fim de fazer face aos desafios do combate moderno.
Quase três décadas depois da criação do MD, fica evidente a consolidação da doutrina de Op Cj, observada em operações recentes das FA, sejam em grandes eventos – Jogos Olímpicos de 2016 e Copa do Mundo de 2014, seja em operações de GLO – Força de Pacificação da Maré na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo. Apesar dos avanços alcançados neste campo, o sargento, “militar sobre o qual recai a solidez da estrutura do Exército Brasileiro (EB)”, nas palavras do General Villas Bôas, ficou, de certa forma, aquém deste upgrade.
O ciclo de ensino na carreira dos sargentos do EB possui dois cursos obrigatórios: o de formação e o de aperfeiçoamento. Além destes, ao longo da carreira, são oferecidos cursos de especialização em áreas específicas e de forma voluntária. Mais recentemente, no terço final da carreira, o sargento tem a oportunidade de ser selecionado para o Curso de Adjunto de Comando (C Adj Cmdo) e de prestar concurso para o Curso de Habilitação ao Quadro Auxiliar de Oficiais (CHQAO). Apesar de possuir inquestionável relevância, nenhum dos cursos supracitados situa o sargento do EB no ambiente de Op Cj ou o prepara para ser empregado em tais operações, o que inevitavelmente ocorrerá ao longo da carreira militar.
O Curso de Aperfeiçoamento de Sargentos (CAS) aperfeiçoa os segundos sargentos para trabalharem no planejamento e na execução de operações no nível tático, enquanto o Curso de Adjunto de Comando extrapola este nível, chegando ao estudo do planejamento de operações no nível operacional. Entretanto, nenhum destes contempla, em seus Planos de Disciplinas (PLADIS), uma abordagem suficientemente aprofundada sobre a doutrina de Op Cj, mesmo capacitando segundos sargentos a ocupar funções de auxiliar de Estado-Maior de Grandes Comandos/Unidades e habilitando os Adjuntos de Comando que assessorarão comandantes em todos os níveis.
Conforme destaca o manual do Ministério da Defesa sobre Doutrina de Operações Conjuntas (MD30-M-01), os planejamentos das Op Cj podem ser conduzidos nos níveis estratégico, operacional e tático. Em todos esses níveis, encontram-se muitos sargentos assessorando seus chefes e comandantes, contribuindo com a valiosa experiência de já terem ocupado variadas funções ao longo da vida na caserna, porém, às vezes, faltando um pouco de embasamento teórico sobre Op Cj, o qual proporcionaria uma visão global da situação e enriqueceria o assessoramento sobre o assunto.
Somado a isto, o Comandante do EB, em suas Diretrizes de 2019, destacou em uma de suas premissas a necessidade de capacitação técnica do militar para enfrentar os desafios da guerra moderna. Aqui, entende-se que não se pode imaginar guerra moderna sem Op Cj. Corroborando com esta premissa, pode-se destacar, no Plano Estratégico do Exército 2020-2023, o Objetivo Estratégico do Exército (OOE) 12 – Aperfeiçoar o Sistema de Educação e Cultura –, o qual reforça a presente reflexão se levarmos em consideração o subitem: 12.2.1.12 Capacitar o militar para atuar em operações de amplo espectro, operações conjuntas e multinacionais (2020-2023).
A Política Nacional de Defesa (PND) destaca como um dos objetivos nacionais de defesa: manter as FA modernas, integradas, adestradas, com crescente profissionalização, operando de forma conjunta e adequadamente desdobradas no território nacional. Nesse contexto, torna-se imperativo desenvolver a capacidade de todos os integrantes das FA de operar em Op Cj. A Estratégia Nacional de Defesa (END), por sua vez, aborda que, para o atendimento eficaz das hipóteses de emprego, as Forças Armadas deverão estar organizadas e articuladas de maneira a facilitar a realização de operações conjuntas e singulares, adequadas às características peculiares das operações de cada uma das áreas estratégicas.
Todos os argumentos apresentados indicam a necessidade do desenvolvimento de uma cultura de Op Cj no ensino formal dos graduados do EB. A introdução desta doutrina passa pela mudança nos PLADIS do CAS e do C Adj Cmdo, introduzindo uma nova disciplina voltada para a compreensão das Op Cj, possibilitando que o sargento, a partir de seu aperfeiçoamento, seja introduzido a esse contexto. Além de mudanças no PLADIS, seria enriquecedor fomentar um intercâmbio de instrutores e alunos das Forças Singulares, o qual contribuiria para fomentar a troca de experiências e conhecimento específico para o CAS e o C Adj Cmdo.
Aqui cabe a reflexão de que o EB anualmente designa sargentos para participar dos cursos de aperfeiçoamento em exércitos de Nações Amigas, como o da Argentina e dos Estados Unidos da América (EUA), por exemplo; porém, não realiza esse mesmo intercâmbio enriquecedor com as Forças Singulares. O Exército Americano, a título de exemplo, possui o Sergeant Major Course, curso disponibilizado aos graduados daquele exército, no qual há uma fase com duração de seis semanas, exclusivamente destinado a introduzir os militares aos conceitos pertinentes à doutrina de Op Cj e a realizar planejamentos dessas operações.
Resta, então, a necessidade de uma atualização nos currículos escolares dos graduados, com foco no CAS e no C Adj Cmdo, a fim de manter estes valiosos recursos humanos atualizados e aptos a participar de Op Cj, o que contribuirá sobremaneira para o estado de prontidão constante da Força Terrestre e o alcance de todos os objetivos estratégicos do invicto Exército de Caxias.