Por Coronel R1 Carlos Daróz
A história militar brasileira é rica em episódios que demonstram como a camaradagem é valiosa em situações que levam os combatentes a situações extremas. Foi o que ocorreu na noite de 12 para 13 de dezembro de 1944, por ocasião da quarta tentativa brasileira de conquistar o Monte Castello, durante a Segunda Guerra Mundial.
Desde o mês de novembro, a Força Expedicionária Brasileira (FEB) tentava subjugar a importante posição estratégica, cuja conquista permitiria a ruptura da Linha Gótica, rede defensiva alemã apoiada na cordilheira dos Apeninos. Apesar da coragem e tenacidade dos pracinhas da FEB, três tentativas de ataque haviam fracassado dada a qualidade das posições alemãs, que dominavam o terreno e os acessos à elevação.
No dia 12 de dezembro, desenvolvia-se mais um ataque, e o Capitão João Tarciso Bueno liderava a 1ª Companhia do 11º Regimento de Infantaria em sua progressão rumo ao Monte Castello. Quando o inimigo conseguiu ajustar seus fogos sobre a subunidade, o Capitão Bueno identificou a situação crítica e passou à frente de seus homens para liderá-los pessoalmente. Pouco a pouco, a eficácia das armas alemãs foi provocando numerosas baixas e a progressão arrefeceu. Diversas subunidades, em setores vizinhos, já haviam recebido ordens para retrair, mas o capitão prosseguiu com seus homens, até ser colhido por uma rajada de metralhadora que lhe provocou graves ferimentos. Caído em uma vala, inconsciente, com várias costelas partidas e com o pulmão esquerdo trespassado por um tiro, o capitão permaneceu no terreno, enquanto os remanescentes de sua combalida companhia retraíam.
Depois de ser informado que o comandante de uma de suas subunidades jazia ferido na “terra de ninguém”, o comandante do batalhão organizou patrulhas para tentar resgatá-lo. Com a proteção da noite, diversas patrulhas vasculharam a região a procura do oficial ferido, uma delas liderada pelo célebre patrulheiro Sargento Max Wolff Filho, mas nenhuma logrou êxito, pois o Capitão Bueno havia rastejado em busca de água e caído em um córrego. Resignado, mas temendo perder mais homens, o comandante do batalhão sustou o envio de novas patrulhas.
Um integrante da 1ª Companhia, no entanto, não se conformou com a situação. Tratava-se do Soldado Sérgio Pereira, natural de Minas Gerais, ordenança do Capitão Bueno. Sabia que seu comandante havia sido visto, pela última vez, com vida, ainda que gravemente ferido, e tomou uma decisão: sairia pela “terra de ninguém” e só retornaria com seu chefe e camarada, ainda que isso pudesse custar-lhe a vida.
Capitão João Tarciso Bueno |
O General Mascarenhas de Moraes, Comandante da FEB, elogiou o Soldado Sérgio nos seguintes termos: “É um magnífico exemplo de dedicação ao chefe, que tenho a mais grata satisfação de apontar à FEB”. O Monte Castello cairia em poder dos brasileiros somente em 21 de fevereiro de 1945, após um quinto e bem-sucedido ataque, abrindo o caminho para o vale do Rio Pó.
Por sua liderança, o Capitão Bueno foi promovido e condecorado pelo Brasil e pelos Estados Unidos. O Soldado Sérgio também recebeu uma promoção e condecorações por bravura. De volta ao Brasil, ambos permaneceram grandes amigos até o fim de suas vidas. Um belo exemplo de camaradagem legado para todos os integrantes da Força Terrestre por esses dois heróis brasileiros, naquela gelada e silenciosa noite de inverno em 1944.
Soldado Sérgio Pereira recebendo a medalha Bronze Star das mãos do General Truscott
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