Por Cel Paulo Roberto da Silva Gomes Filho
Azerbaijão e Armênia estão em guerra. O conflito de alta intensidade explodiu há seis dias mas, na verdade, trata-se da continuidade de uma disputa que tem suas origens na independência dos países da antiga União Soviética, no final dos anos 1980.
Para entender as causas da guerra, suas repercussões regionais e possíveis desdobramentos, é fundamental entender o contexto político, histórico e geográfico das duas partes em conflito.
O Cáucaso é a área geográfica que divide a Europa oriental da Ásia. Trata-se de uma faixa de terra espremida entre o Mar Negro, a Oeste e o Mar Cáspio, a Leste. Seu nome é emprestado da grande cordilheira que atravessa toda a região, de leste para oeste, separando a Rússia, ao Norte, da Georgia e do Azerbaijão, ao Sul.
Armênia, Azerbaijão e Geórgia eram repúblicas da antiga União Soviética (URSS). A independência desses países ocorreu no final da década de 1980, durante o processo de esfacelamento soviético. Após a independência, o impasse sobre a região de Nagorno-Karabakh explodiu. O enclave tem sua população majoritariamente armênia mas localiza-se em território reconhecido internacionalmente como sendo azerbaijano. Esta é uma situação herdada do tempo em que toda aquela área era URSS, quando o governo central entregou o enclave ao Azerbaijão.
O descontentamento da maior parte dos moradores da região, que não se consideram azerbaijanos, levou ao conflito, travado entre 1988 e 1994 e que foi interrompido com um saldo de 30 mil mortes, por meio de um acordo de cessar-fogo que não resolveu politicamente a questão. Desde então diversas escaramuças fronteiriças vêm ocorrendo, com o Azerbaijão tentando retomar o controle sobre o autodeclarado (mas que não reconhecido por nenhum país, nem mesmo a Armênia) Estado de Nagorno-Karabakh.
Conflito em Nagorno Karabakh. Fonte – BBC
Dessa forma, há cerca de uma semana, o conflito ressurgiu, desta vez com alta intensidade. As imagens divulgadas por todas as mídias mostram colunas de blindados, artilharia, aviação, sistemas de aeronaves remotamente pilotadas (SARP), enfim, o pleno emprego dos meios militares à disposição das partes em conflito. Como em qualquer guerra, como já disse Clausewitz, “as notícias que nos chegam da guerra são quase sempre contraditórias, na maior parte, também falsas. As mais numerosas são em grande quantidade sofrivelmente suspeitas.” Assim, no calor do momento e entre as campanhas de desinformação e de operações psicológicas de ambos os lados, o mundo vai tomando conhecimento das operações militares no terreno. Entretanto, pelo que se pode vislumbrar através da bruma da guerra, e em uma avaliação bastante preliminar, o emprego dos SARP e o apoio decisivo dos turcos aos azerbaijanos talvez desequilibre o poder de combate em favor dos últimos.
As potências regionais e globais vão se alinhando às partes em conflito, sempre na defesa de seus próprios interesses. A Turquia e a Rússia são os principais atores externos envolvidos e, mais uma vez, assim como na Líbia e na Síria, estão em lados opostos. Os turcos apoiam abertamente os azerbaijanos, com quem possuem grande identificação histórica, linguística e cultural. Mas também há fortes interesses econômicos. O Azerbaijão é parceiro da Turquia na operação do gasoduto Transanatoliano, uma alternativa de fornecimento energético que reduz a dependência turca em relação ao gás russo.
Gasoduto TANAP. Fonte - https://www.researchgate.net/figure/The-TANAP-TAP-and-Nabucco-pipelines_fig1_322927029
Já os russos, que integram juntamente com Bielorrússia, Cazaquistão, Quirguistão e Tadjiquistão uma aliança militar com a Armênia, a Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC), e já têm problemas na Líbia, Síria, Ucrânia e Bielorrússia, não parecem muito dispostos a se engajar decisivamente em um conflito no Cáucaso.
Assim, vê-se que a resposta calculada da Rússia frustra a Armênia, cuja solicitação formal de apoio militar à OTSC não foi atendida até o momento, em contraste com o decisivo apoio turco aos Azerbaijanos.
Os EUA, completamente concentrados em suas questões internas e nas eleições presidenciais, não passaram de exortações protocolares pela paz. A Europa, com o presidente Macron à frente, assim como as Nações Unidas, também fizeram declarações em favor da paz que não alcançaram qualquer resultado prático.
Assim, parece que a solução do conflito dependerá de as partes envolvidas chegarem a um acordo, ou da ação da Turquia e Rússia. Mais exatamente de até onde os russos tolerarão a expansão da influência turca, também naquela região.
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