terça-feira, 17 de maio de 2016

CRIADO PARA SER MODELO, SAMU MACRO NORTE PEDE SOCORRO

REPRODUÇÃO: O NORT.NET


Funcionários reclamam que a intervenção política está comprometendo a qualidade técnica do serviço e a falta de manutenção de ambulâncias está colocando em risco a vida de socorristas pacientes.



A enfermeira Linda Márcia Freitas diz que os recursos humanos vêm sendo preteridos em detrimento de questões políticas, desqualificando o serviço, que, hoje, é o pior avaliado entre os sete Samu’s regionais do Estado

Organizado para servir de modelo para as outras regiões de Minas Gerais, em 2009, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência do Norte de Minas (Samu Macro Norte), nos últimos anos, vem sofrendo um grande desgaste, deixando, inclusive, de ser referência para os demais serviços integrados do Estado, conforme foi programado.

A afirmação é da enfermeira e presidente da Associação dos Servidores do Samu Macro Norte (SindSamu), Linda Márcia Freitas, segundo a qual os recursos humanos vêm sendo preteridos em detrimento de questões políticas, desqualificando o serviço, que, hoje, é o pior avaliado em termos de qualificação, treinamento e remuneração entre os sete Samu’s regionais do Estado.

O Samu Macro Norte possui base em 37 municípios, onde trabalham cerca de 780 profissionais, cobrindo 86 municípios da região e, de acordo com a presidente da Associação, a remuneração ainda é a principal reivindicação dos trabalhadores, que lutam por um reajuste de 40% dos salários.

- O Samu Macro Norte já foi uma referência, inclusive treinou equipes de outras regiões, mas hoje já não tem mais destaque, devido à má gestão, e opera com o pior salário entre os Samu’s de Minas Gerais. Para se ter ideia, desde a implantação do serviço, em 2009, só houve um aumento de 10%, concedido no ano passado. Além do salário defasado, o auxílio-alimentação também nunca foi reajustado e nem todos os funcionários recebem adicional de insalubridade, mesmo todos estando aptos e de sobreaviso para atuar na intervenção em caso de urgência maior ou de ocorrências com múltiplas vítimas. Já os que atuam diretamente na intervenção não recebem periculosidade, mesmo sendo um trabalho de risco – completa Linda Márcia.

A enfermeira elenca, ainda, a falta de incentivo para os profissionais que trabalham temporariamente em outro município, mas que não recebem nenhum custeio, e também não há padronização da remuneração por categoria, causando constrangimento e repúdio entre os funcionários.

- O serviço funciona priorizando as questões políticas, atendendo aos interesses de um grupo restrito, deixando de lado as questões técnicas. Não temos uma CIPA, não temos acordo coletivo de trabalho, e nos casos em que o funcionário sai para atendimento a uma ocorrência e retorna horas depois de encerrada sua jornada de trabalho, não recebe nenhuma remuneração por esse tempo extra trabalhado. Muitas vezes o funcionário pede à Central de Regulação para aguardar de 15 a 20 minutos até que seja trocado o turno, porque sabe que vai demorar muito além do seu horário e não vai receber por isso. A consequência é o atraso no atendimento ao paciente, mesmo sendo um caso de urgência – relata a enfermeira.

Segundo a presidente do SindSamu, a situação trabalhista é tão grave que o funcionário de uma base descentralizada que está de atestado só pode fazer a perícia em
Montes Claros, se deslocando por conta própria.

- Para quem trabalha em uma base distante como Taiobeiras, Berizal, Miravânia ou São Romão, por exemplo, em que é necessário mais de um dia para realizar a perícia, o custo é muito alto para quem ganha um salário que recebe mal dá para custear as despesas pessoais.


Linda Márcia relata ainda os treinamentos são realizados para atender a interesses políticos e que muitos funcionários são contratados também por indicação política, mesmo não tendo qualificação técnica para o serviço.

- Além disso, diferentemente dos anos anteriores, não há diálogo da diretoria com os funcionários, que se recusa a nos receber, segundo a assessoria, por falta de agenda. Recentemente, um funcionário efetivo foi exonerado sem sequer passar por uma sindicância ou processo administrativo, nem ter tido o direito à defesa. Quando procuramos o setor de recursos humanos, a gerente relatou que foi realizada a sindicância, mas apresentou um documento com data de 8 de fevereiro, curiosamente, um recesso de carnaval – questiona.

SEM TRANSPARÊNCIA
A enfermeira reclama, ainda, da falta transparência na aplicação dos recursos e diz que, recentemente, houve um repasse de recurso de R$ 7 milhões e até agora não foi possível identificar nenhum benefício no serviço.

- A prestação de contas, que deveria ser pública, também é mantida em sigilo. Desde o início da gestão do então presidente Joaquim Dias (Kincas), prefeito de Salinas, que estamos cobrando o Portal da Transparência, e até agora nada. Os problemas financeiros sempre foram atribuídos a gestões anteriores, e chegamos sugerir que fosse feita uma auditoria, indicamos representantes dos funcionários para acompanhar os trabalhos para dar mais transparência, e sugerimos, ainda, que as inconformidades detectadas fossem levadas ao conhecimento do Ministério Público. A comissão foi constituída pelo então presidente, lavrada em ata pela assessoria jurídica, mas não saiu do papel. Também não há a menor preocupação com os veículos, que estão sucateados e sem manutenção preventiva, colocando não só os socorristas em risco, mas também a vida dos pacientes – relata a enfermeira.

Sobre a situação das ambulâncias, um condutor socorrista e um médico, que pediram para não serem identificados, disseram que por várias vezes tiveram que baixar a ambulância com paciente dentro, porque o veículo parou de funcionar por falha elétrica.

- Isso quando não sofre pane geral. Houve várias situações em que a ambulância, com paciente grave sendo transferido, ficou por horas na estrada, aguardando por outro veículo, porque parou subitamente por falha mecânica – denunciam.

CISRUN
Em entrevista ao jornal O Norte, um dia antes da posse como presidente do Consórcio Intermunicipal da Saúde da Rede de Urgência do Norte de Minas (Cisrun), ocorrida em 29 de abril, o prefeito da São Francisco, Luis Rocha Neto, admitiu que o consórcio enfrenta uma situação muito difícil, com queixas, sobretudo, por parte dos próprios servidores, e que iria constituir uma comissão para avaliar a situação, priorizando a questão técnica no trabalho de rotina.

- É uma instituição que não vive uma situação fácil. Em primeiro lugar, vou querer ouvir a equipe que está em exercício. Certamente a questão política não pode ser maior do que a questão técnica e é em cima dessa máxima que iremos trabalhar – afirmou o prefeito na entrevista.

ESCLARECIMENTO
Em nota, a assessoria de comunicação do Cisrun informou que dos R$ 7 milhões liberados pelo Estado para o Samu Macro Norte, foram creditados apenas  R$ 1 milhão, no último mês de março, para pagamento de débitos em aberto e compra de insumos em geral, e que o restante será liberado em parcelas mensais de R$ 500 mil, retroativas a janeiro de 2016, após formalização de um contrato.

Em relação à transparência na prestação de recursos, o Cisrun informa que o Portal da Transparência está em processo de licitação.

Sobre a condição das ambulâncias, o Cisrun informa que recebeu no último mês de janeiro seis veículos, sendo 02 de suporte avançado (USA) e 4 de suporte básico (USB), para substituir os que estavam em más condições de uso, mas não informou sobre a manutenção preventiva dos cerca de 40 veículos que permanecem em uso no serviço.

Já relação à insalubridade reclamada por técnicos que cumprem trabalho como auxiliar de regulação médica, a nota informa que o Consórcio é cumpridor de todas as obrigações trabalhistas vigentes na CLT e que o adicional de insalubridade é pago a todos os empregados que trabalham expostos a agentes químicos, biológicos e físicos
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